sábado, 12 de fevereiro de 2011

Contos de Casais - o conto indiscreto

Arpoador
Sinto-me uma espiã


Eu tinha escrito palavras perigosas.

Revelava um segredo terrível. De amplas e dolorosas consequências,em todas as direções. Sem imunidades, causaria solidões irreconciliáveis. Era descritivo demais, bastava juntar duas palavras e encontraríamos os criminosos.

Estranhei a sensação. Desconforto. Preocupação. Como disse Marx, a filosofia tem que servir para revolucionar. Assim desejo minhas falas: mudanças para o bem, outras não me interessam.

Fui orientada pelo meu mentor a ocultá-lo. Sensata que sou, ocultei. Descartei-o, porque a mente saudável descarta o que faz mal. As pessoas saudáveis descartam o que não deve ser mantido. Chegou a minha vez. Deletei o texto.

Porém, preciso substituí-lo. Não posso deixar um vazio na prateleira. Um textinho é um pedaço de vida, e não dá para abrir mão de vida. É preciso escrever outro, é preciso preencher vida com vida, amor com amor. Sem vazios. Trazer outras palavras para a prateleira.

Tentei escrever sobre o amor que sinto; talvez não interesse a ninguém.

Pensei nos amores que já vivi, mas temo complicar os ex-companheiros. Suponho que as versões por eles apresentadas seriam conflitantes com as minhas. Provavelmente. Não quero isso, prezo nossa convivência cordial.

Pensei nos amores das minhas amigas; tenho medo de cometer repetições, somos todas muito exageradas e verborrágicas. Nossas histórias são quase que de domínio público, portanto, histórias já conhecidas. Gostaria do desconhecido e não do previsível.

Pensei nos amores da família, dos primos e irmãos. Nào quero nenhum. E só de primos são quinze, veja bem quantos amores a contar. Pensei nos amores dos filmes, bem ou mal sucedidos. Não. Nos amores dos livros, em Capitu, a quem idolatro. Nada. Tudo me parece sem graça.

A única inspiração que me vem é a do conto proibido.

Há momentos em que nada satisfaz. Só uma situação, só uma pessoa, só um beijo, e parece que quanto mais proibido, mais desejado é.

Compreendo portanto, os amantes. Compreendo os compulsivos. Compreendo os vencedores, que dormem e acordam pensando na vitória, até que a alcançam. Compreendo os que tramam, os que amam em silêncio, e que acalentam uma idéia no escuro do seu quarto. A luz do dia exige esconderijo.

Compreendo os espiões, que optam pelo anonimato. As realidades ocultas são altamente sedutoras.

Não há como substituir o conto indiscreto. É único. Como único também, é o amor que o assopra em meu ouvido.

Um comentário:

  1. Bettina amiga, você tem alma de escritora....maravilhosooooooo ainda te vejo no Jô

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