domingo, 30 de outubro de 2011

O figurino da nigth

Rio,

Copa,
Mar,
Atlântica
Del Mar


Somos diferentes


Meu amor que me desculpe, mas vou desobedecer e comentar.
Ele disse - que besteira, tanta coisa mais importante para dizer.
Náo sou de retrucar, sou da antiga, gosto de atender, e ele há de me perdoar.

Estou intrigada. Há agora um uniforme para a mulherada sair `a noite?
Eu digo porque vi umas sessenta, cem, muitas, todas vestidas iguaizinhas: saia curta, curtíssima. Blusinha decotada, decotadíssima, justa. Pode ser um vestido, pequeno, pequeníssimo, que dá no mesmo. Ou preto, ou bege, que agora resolveram chamar nude. Para mim, é bege.

Todas de pernáo sarado e saltos bem altos. Entendi o cumprimento das saias, afinal, de que adianta malhar se náo for para mostrar, náo é mesmo?

Louras, na maioria, o Rio deve ter sido invadido por alemàs e austríacos há vinte anos, a História náo documentou, mas vieram e deixaram filhas, porque há uma geraçao de louras.

Em que isto me intriga? Ora, o figurino caracteriza um personagem. Ao entrar no palco um Rei, sabemos que é um Rei porque usa coroa. Nesta linha, ao entrarem as moças, sabemos quem sáo pelo traje - estamos diante da personagem piriguete. Clones das panicats. A sonoridade da palavra é também semelhante.

Isto me apavora. Pelo lado moral da coisa mesmo. Sáo prostitutas? Náo sáo.
Mas o traje é o delas - curto, nu, justo, subindo. Porque uma moça deseja parecer prostituta se náo é? Para ser aceita pelo grupo? Agora é moda parecer prostituta? Francamente, vamos respeitar a profissáo mais antiga do mundo. Quem é, que seja, mas quem náo é, náo use o uniforme que náo lhe pertence.

É uma irmandade de iguais. Cabelos, roupas, comportamento. Náo há saia com mais de um palmo, nem salto com menos de 20 cm. Até os perfumes sáo os mesmos - 212, tommy, ck.
Onde está o estilo? Onde está a identidade? Onde está a marca da sua personalidade?
Onde está a sua cara?

Em lugar nenhum. Todas aparentam a mesma idade, todas aparentam ter os mesmos hábitos - sol, musculaçao e cabelereiro - náo sei quem faz arquitetura, quem faz engenharia, quem faz teatro. Quem náo faz porra nenhuma. Náo dá para perceber, se estudam ou náo, se trabalham, ou náo. Náo há sinais exteriores de quem sejam. Estáo uniformizadas de corpo e alma, e escolheram unânimes o mesmo personagem.

Estáo limitando-se, copiando-se. A coisa pode náo funcionar bem. Vamos lá. Para um roteiro de teatro, personagem distintos, Esposa, amante, secretária. Para uma empresa, cargos distintos: o contador, o vendedor, a recepcionista. Para uma festa ser interessante, há que ter pessoas interessantes; os iguais náo oferecem troca, náo há crescimento, náo há curiosidade. Os iguais sáo chatos em sua repetiçao de si mesmos.

Pelo que vi, náo adianta levantar bandeiras de diversidade sexual. Temos que levantar a bandeira da diversidade dentro do mesmo gênero sexual. As mulheres podem, e devem, ser diferentes entre si. A beleza tem cores e formas várias, como as flores, pequenas, grandes, claras, coloridas. Náo há só margaridas. Há vitórias régias, há cravos, orquídeas. Podem escolher personagens diferentes, a intelectual, a professora de jazz, a atleta, a moça de família, a transgressora, a inquieta, a simpática.

O brasileiro, macho estereotipado toda vida, continua a rejeitar o que é diferente. Fixou em sua mente este formato, e as meninas estáo tentando se encaixar. Quem náo couber no molde, encalha. Bonecas em série.
Falta rebeldia nesta geraçao feminina. Falta questionamento. Anos de conveniência modelaram corpos e mentes.

Gostaria de ver uma geraçao mais critica. Mais ousada. Menos uniformizada, mais criativa, com mais orgulho de si mesmas, e coragem para usar - e viver - o que quiserem.

Elas podem ser estilosas. Beyonce linda, em visual diferente do seu habitual

sábado, 29 de outubro de 2011

Noel, feitiço bonito da Vila Isabel

Rio

Leblon

- Cafë, madame?
- Sim,Café Pequeno

NOEL - FEITIÇO DA VILA de Andreia Fernandes.
Cia de Theatro Musical Brazileiro. Dir. Édio Nunes e Jorge Luis Cardoso. Dir. Musical Wladimir Pinheiro. Teatro Café Pequeno.


O apito da fábrica de tecidos me chamou. Fui, assim, meio fugida do dia, meio apressada da noite, e entrei.

O palco é pequeno, mas o talento é grande. A Cia de Theatro Musical Brazileiro está aí para provar: nada substitui o talento, já foi dito e aqui repito. Pouco espaço e muito talento tornam o espaço suficiente – um varal é cenário, um lenço é figurino. Um violão, bem um violão é um universo na máo deste elenco.

Encontrei Noel, encontrei Aracy, encontrei Patricia Costa, esbarrei em Cartola e Ismael Silva. E aí, caríssimos, náo encontrei mais ninguém. Perdi-me na boêmia da Vila Isabel de um tempo bonito.

A história deste gênio da notas musicais foi contado por outros, em outros palcos, e talvez com mais recursos financeiros. Não sei dizer se com tanto capricho. Capricho de malandro, que sabe que é no detalhe que se ganha a confiança. É no miudinho do samba que o mestre se mostra.

Com mais foco na música que na dramaturgia, o espetáculo passa como a Vila Isabel na avenida: belo aos olhos, aos ouvidos, ao coração. Lindo de se ver e de cantar, e o público assiste a um show de Noel e a uma peça sobre a sua vida pelo mesmo ingresso. Não há adereços luxuosos nem carros alegóricos fenomenais, há um varal e vê-se o Morro. Há cadeiras e garçon, e vê-se o bar. Moças enfeitadas e malandros, temos um cabaré.

A simplicidade funciona, caríssimos, e isto é fantástico. É a liberdade da expressão do artista, sua independência de orçamentos e patrocínios. Seu talento.

Pedro Arrais é um Noel irresistível, talvez o rapaz seja belo demais para o papel, afinal, Noel tinha o maxilar direito deformado pelo fórceps que o trouxe ao mundo. Em seu favor, precisamos lembrar que Noel seduziu cabrochas experimentadas, o que exige qualificações; então que seja Pedro Arrais o Noel de hoje, seduzindo com sorriso, chapéu panamá e sapato bicolor. Branco como Noel, sedutor como um malandro de gafieira. Quem viu, concorda, e como.

Francisco Alves, voz de ouro, era um explorador de iniciantes, e um canastráo de primeira. Gabriel Titan nos convence disto, e canta de verdade, com graves brilhantes de dar inveja. Vejo nele o cantor que atua, ou o ator que canta. Uma voz dessa náo pode se calar. Estamos na era dos musicais, está para ele, ponto.

E como se náo bastasse, há Patricia Costa no palco.

Atriz que vai de Aracy de Almeida a cabrocha da Mangueira; que vai de lavadeira a estrela brilhante. Aracy, reconheçamos, deve ter sido pioneira em sua macheza na roda da malandragem, e era feia de doer. Patricia esteve perfeita no papel. Cabelão sem trato, calça reta, óculos fundo de garrafa. Bicando cachaça e cuspindo no cháo. Em dois minutos sai de Aracy e volta de estrela. Irreconhecível, elegante, metaforseada, chiquérrima. Afinadíssima, suave, ela entorpece a platéia com a melodia e a poesia dO Apito da Fabrica de Tecidos, e neste momento, todas nós queríamos que a moça da fábrica, artigo que náo se imita, desse bola para Noel Rosa.

É isso. O talento da transformaçao - Aracy vira Patricia, Pedro virou Noel e Gabriel virou Francisco Alves. E o elenco todo deu seu melhor. Entre iniciantes e experientes, todos eram o povo da Vila, da Mangueira, do Morro dos Macacos em tempos de paz e samba.

Parabéns aos diretores, atores, músicos. Provaram que não precisa ter 200 pessoas no palco. Bastam 13. Basta um bom roteiro. Basta bom gosto.
Basta um Brasil, rico em artista talentosos.

Basta o ilustre Noel Rosa, que luxo.

O ótimo elenco, na cena da despedida - volte logo, Noel

Nota - meu avô, orgulhoso morador da Rua Teodoro da Silva, coração da Vila, teria curtido muito, ah, teria.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Espera que é hora da FESTA

Rio de Janeiro

Rio, rios, janeiros, outubros...junhos...

Esperas
"Quem espera sempre alcança" - Sei não



Desenvolver tolerância e paciência. Exercitar a humildade. Exercitar a virtude da condescendência. Evoluir. Perseverar. Ter consciência da simplicidade da vida diante da amplitude do universo.

Muito que bem. Vamos praticar.

Você é convocado, caríssimo, intimado ou notificado, sei lá a nomenclatura correta, e precisa depor na Justiça do Trabalho. Você sabe da importância de seu depoimento. Você tem um documento oficial em mãos com o selo nacional, seu nome completo ali, printadaço, e você, portanto, vai depor.

Audiência às 13:50. Você chega às 13:15.

Fila no prédio moderno da Rua do Lavradio. Fila para o elevador, fila andando, rápida, você até se anima e pensa que hoje não será como das outras vezes em que esteve aqui e não pode registrar sua narrativa nos autos do processo. A primeira vez houve uma coisa qualquer que precisava ser corrigida pelos senhores advogados; na segunda vez a justiça estava sem sistema, fato impensável, visto que a justiça é a garantia do sistema.

Bem, você então chegou antes da hora e aguarda o momento em que poderá abrir a boca e dizer o que viu, especialidade minha.

Às 15:00 seu nome é anunciado em um microfone desafinado. Meio assustado, você adentra a mesma salinha conhecida. Uma senhora juíza em trajes de onça e cabelo acaju diz-lhe, que o processo é muito longo e que não sabe se ouvirá todas as testemunhas, até porque, a escrivâ, funcionária concursada da justiça,tem uma FESTA, e precisa deixar o recinto Às 17:30 no máximo. FESTA. FESTA. FESTA. Palavra inacreditável que ecoa na atmosfera judiciária. Pronunciada com o tom solene atribuído a CONDECORAÇAO, talvez, mas foi FESTA mesmo a palavra que ouvi. Sem outra opção, e atônito, você volta para a sala de espera. Pode ser que tenha aguardado estas horas em vão.

Às 17:00 você é informado que de fato não será ouvido. Sabe-se que a escrivã tem uma a FESTA e você vai para casa, para o trabalho, para o raio que te parta, porque depor você não vai.

Volte em Junho.

Eu não sei o que você faria. Mas sei o que fiz. Saí. Para nunca mais voltar. Quem quiser meu depoimento que venha atrás de mim em viatura policial com sirene ligada. Nào me mande cartas. Quem quiser meu depoimento faça de um tudo mas náo me mande a tal carta, notificaçao, intimação, náo me lembro o nome da correspondência que eu recebi; afirmo, sob juramento, que não será respondida com o meu deslocamento obediente. A partir desta desfeita, desloco-me somente para responder a cartas de amor.

Senhores, este fato teve lugar em 27 de Outubro, na 69a Vara de Conciliação e Julgamento, e é real. Antes fosse ficção. Por três vezes fui ao prédio judicial da rua do Lavradio para contribuir para a apuração de fatos; por três vezes fui tratada como se meu tempo nada valesse, como se minha ausência ou presença não fizesse a menor diferença no processo, ou por outra: como se a autora da ação, iniciada em 2009, fosse uma marionete na mão do tão decantado Estado Democrático de Direito. Trata-se de uma honesta trabalhadora, cumpridora de seus deveres, pontual e assídua.

O maior valor que temos é o nosso tempo. Esse sim é nosso euro, nosso real, nosso dólar. É nossa moeda de troca; bem usado, o tempo garante uma existência melhor.
Mau usado, afundamo-nos. A juíza náo sabe quanta coisa eu tinha para fazer por mim, pelos meus colaboradores, pelos clientes, pelos meus filhos, e náo fiz. Joguei tempo fora.

Não. A juíza náo pensou na autora da açao, nas testemunhas, nas advogadas, nas prepostas. Pensou somente na festa da escrivã.

Aliás, sra. Escrivã. Sua FESTA custou horas do nosso valioso tempo e mais alguns meses para a trabalhadora requerente dos serviços estatais. Constitucionalmente garantidos.

Tomara que tenha sido muito boa.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

A menina chinesa

China
Brasil
África


Um minuto de silêncio por Yue Yue




Todos vimos na TV, atônitos, as cenas do atropelamento da menina chinesa, que vagava desacompanhada por uma via pública. Foi atingida por uma van, atingida por um segundo carro, e foi atropelada novamente como se fosse uma boneca sem vida. Dezoito pessoas passaram a seu lado, e a ignoraram, cruel e friamente. Estava sozinha no mundo dos inimigos. Um lixeiro gritOU por ajuda, e foi também ignorado. A menina foi levada em coma para o hospital e náo resistiu.

Tinha dois anos e chamava-se Yue Yue.

A máe náo estava por perto, e levou vinte minutos para ser localizada. O pai apareceu chorando na TV, desesperado.

Comenta-se pela mídia: que gente má. Que raça terrível, essa dos chineses. Matavam meninas desde a antiguidade. Cometem atrocidades, e atualmente escolhem nos hospitais quais receberáo atendimento. Náo atendem portadores de HIV, podem contaminar os demais pacientes, por exemplo.

Os chineses passaram pela pequena, minúscula criatura, ferida em estado gravíssimo, sem olhar duas vezes. O brasileiro chamaria uma ambulância, faria um escândalo. Somos solidários, e ficaríamos a seu lado até que os bombeiros, nossos maravilhosos bombeiros, a socorressem. Certa disso. Aqui no Brasil esta menina náo teria ficado no cháo, como ficou. Ok. Nossa solidariedade finda aí.

Sim, façamos uma pausa. Somos assim tão superiores? Quantas crianças famintas, doentes, e abandonadas vagam pelas nossas ruas? Frio, sujeira, pedófilos, a tudo expostas? Qual atitude tomamos? Chamamos a SAMU para socorrer o menino negro e pobre que grita de dor? Talvez, se em local seguro. Lembremos que a polícia matou Juan a tiros, a queima roupa, e jogou seu corpo no rio. Polícia brasileira. Lembremos do Nardoni, que jogou a própria filha pela janela.

As imagens do atropelamento chocam.

Ë menina muito pequena, parece uma boneca, de pele clara, e aparentemente bem vestida. Temos tribos inteiras na África a morrer de fome, de sede, de Aids, e náo nos chocamos mais com o sofrimento destes inocentes.
Temos milhares de crianças Brasil adentro, a secar de fome, e náo corremos para acudí-los. E muito mais que dezoito cidadáos passam por elas todos dias.

Náo falemos em iminência da situaçao. Toda vida em risco exige urgência.
Sempre podemos dar uma desculpa para que um mal pareça maior e amenize os demais atos. Focamos no que tem mais impacto, e os atos menores parecem menos importantes. Náo são.

Somos todos uma raça de gente cruel. Náo só os chineses.

Alguns cruéis pela força, outros pela mente, outros por armas de fogo, outros por armas químicas, outros por corrupçao, outros por violência. A esmagadora maioria é cruel por omissáo.

Ao chorarmos pela chinesa, choremos por todas as demais. Talvez esse anjo de olhos puxados tenha vindo ao mundo unicamente para esse sacrifício. Para que chocados e estarrecidos, mudemos de rota e paremos para acudir o próximo que sofre. A vida humana TEM que valer mais do que vale hoje, muito, muito mais.

Ao julgarmos os motoristas criminosos e os 18 transeuntes assassinos também, julguemos os homens maus de todos os povos, e de todos os Governos, que tiram a comida das crianças, e enriquecem com a sua miséria. Que negam-lhes socorro diariamente nos hospitais sem médicos e sem equipamentos. Sem remédios.

Senhores, os internautas estão aí afirmando que os chineses náo valem nada mesmo. Mas nós, brasileiros, também estamos precisando valer mais.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Medianeras

Mi Buenos Aires querido
Si


Encontro marcado com os argentinos



Medianera é a parede lateral de um prédio, chamada de parede cega, habitualmente náo tem janelas e por vezes há propaganda.


Caríssimos, temos um encontro, e é em Buenos Aires.
Problema para alguns, já que cariocas e argentinos estranham-se. Futebol, talvez.

Para mim, náo. Detesto brigas de futebol e adoro Buenos Aires. Já desembarquei em Ezeiza com camisa 10 da seleçao e fui muitíssimo bem recebida. Efusivos olás.

Eles náo nos odeiam, para nada, como dizem. Somos muy amigos.

E o argentino é uma criatura especial - politizado, apaixonado, sôfrego, orgulhoso, brigáo. Lutam pelos seus brios, e pelos alheios. Opinam sem cerimônia uns sobre a vida dos outros, como terapia coletiva e pública, questionam-se mutuamente.

São críticos, reclamóes, e...na maioria das vezes tem razáo.

Este filme é bem isto. O casal Martin e Mariana náo se conhece. Sáo fóbicos, fumantes, sofridos, bolas baixas, reclamam da vida, da economia, da arquitetura sufocante, das contrariedades urbanas, e... tem razáo. As cidades de hoje náo convidam ao romance, e ainda o dificultam. Há poucos janelóes, poucas varandas, poucas flores. Poucos momentos de paz, e muitos desencontros. O ambiente moderno, afirmam, sufoca e angustia, e incentiva o afastamento dos indivíduos. Tem razão, estáo afastados. Cruzam um pelo outro mas náo se vêem.

A tela mostra uma Buenos Aires difícil de reconhecer. Muito cimento, muito prédio antigo, muito trânsito, nenhum apelo portenho. Muito isolamento, cada um no seu micro apartamento, numa independência que mais parece solidáo. Raros diálogos, ouvimos o pensamento dos personagens, suas lástimas.

O filme, apesar da cor cinza, e do teor deprê, tem tiradas ótimas, pitadas de ironia, toques de humor, e vai-se levando a película como fazemos com a vida - buscando o próximo dia com uma certa esperança, ainda que tímida, pequena, escondida, mais semelhante a uma provocaçao com o destino do que propriamente uma esperança.

Entre cigarro e outro, entre trabalho e mais trabalho, entre chat e outro, entre decepcáo e outra, o casal fóbico resolve abrir uma janela na medianera e deixar o ar entrar. Deixar arejar, entrar a luz do dia.

Cinza, mas luz.

Eu curti. No meio de vida moderna, autômata e repetitiva, temos que abrir uma janela a marretadas e olhar para fora. Para as ruas cheias, com pedestres e ciclistas e motoristas indiferentes, que náo te olham, náo te vêem, mas que ainda assim, é preciso olhar. Inconformar-se com esta cegueira geral.

Um dia acharemos o que procuramos. É preciso firmar a vista; tal qual no livro de Wally. É difícil, está misturado na multidão, mas tem lá o Wally com seu cãozinho, na cidade, e o encontraremos, ou ao grande amor de nossa vida. E correremos para ele, parceiro ideal para uma Cumparsita.

Martin (Javier Drolas) y Mariana (Pilar López de Ayala), portenhos, solitários universais - Premiados no Festival de Gramado e no de Toulouse

domingo, 16 de outubro de 2011

Chopin e Sand

Rio,
Leblon
O que seria do Rio sem o Leblon?
E o que teria sido de Chopin,
sem Sand?


Lindo Chopin, Linda Sand

Eu amo Chopin.
Composiçoes tristonhas, lentas, fortes, frenéticas.
Acompanhou-me infância adentro e adolescência afora nas aulas de ballet - todos, absolutamente todos os exercícios de barra eram executados sob o ritmo de Chopin.
Adágios, adágios, e mais adágios. Hoje reconheço que tive a honra de ter Chopin em meus ouvidos e pés, durante muitos anos.

Sabido que fôra um gênio, sobrenatural seu dom. Incorporava o som de suas composiçoes; era o corpo de suas partituras. Isso sabe-se, sua obra é legado universal, e espera-se e perdoa-se em um gênio, sua extravagância. Sua excentricidade, suas loucuras e desvarios fazem parte de sua personalidade, e caracterizam-no ainda mais. Chopin náo havia de ser diferente.

O espetáculo mostra o romance entre Chopin e George Sand, pseudônimo da condessa Aurora Dupin. Outro gênio, escritora genial em sua irreverência e ousadia.
Teríamos portanto, a bomba e o estopim. Dois gênios juntos sob o mesmo teto. Explosáo.

Nada disso, gente. Romance sem palavras é um espetáculo suave, profundo, cálido.
Doloroso sob vários aspectos. Vi no palco do Teatro um casal com problemas de gente comum, problemas bem atuais inclusive - o homem que é egoísta, infantil, voluntarioso, imperativo, estúpido. E a mulher que é doce, carinhosa, condescendente, cuidadosa, amorosa, rejeitada e explorada.
Lindos, Françoise Fourton e Marcelo Nogueira
Foto:Divulgação

Sand podia ser corajosa da porta para fora. Da porta para dentro, todos os seus atos eram para atender, prover, cuidar e sustentar a saúde e a criaçao da obra de Chopin. Mecenas, talvez, apaixonada, certamente, ela escreve dia e noite, como uma operária da literatura, para manter seu reino. Chopin teve ao seu lado, a vida tranquila que sua saúde péssima e seu coraçao duro exigiam.

Sand fez de tudo por este homem. Poucas vezes recebeu dele carinho ou amor. Companheiros de boêmia, sim, mas de cama, náo. Chopin a rejeitou por anos, vivendo sob o mesmo teto.

E ela, como tantas, seguiu. Até que um dia, um belo dia, saturada, encerra o assunto, liberta-se, e seguem, cada um o seu caminho.

O texto da despedida é de rachar o coraçao. O amor é triste, tristíssimo quando acaba. E náo adianta voltar sobre o que restou, Sand afirma sabiamente. Náo adianta mesmo. E escrever outro fim para o romance também náo foi possível para a escritora. As histórias reais náo sáo escritas pelos humanos, talvez por deuses temperamentais.

Temos entáo uma história linda, um Marcelo Noqueira ótimo, como Chopin, e uma Françoise Fourton divina. Futuquei na Wikipedia. Françoise tem mais idade do que parece, náo cometerei a deselegância de repetir dados que nem sei se sáo confiáveis, mas se sáo verdadeiros, esta mulher é um fenômeno. Corpo, rosto, mãos, voz, movimentos, trejeitos, brilho no olhar, nada lembra a idade afirmada pelo site - passa por uma mulher de trinta anos com a maior tranquilidade. E dá um show no palco. Grande atriz, envolve o espectador com sua escritora/condessa/apaixonada/ dedicada/ cúmplice/incansável George Sand, e esquecemos do mundo diante do mundo que criou para seu Chopin. Compreendemos perfeitamente o tamanho do seu amor.

Deste espetáculo tirei duas conclusóes: 1. Chopin era insuportável. Fosse marido meu, iria compor ao relento e morreria tísico. Um chato de primeira. Eternamente reclamando, insatisfeito, inseguro, irritado, perdulário, egocêntrico e desprovido de apetite sexual.
2. Nós, mulheres, somos responsáveis pela maioria das maravilhas do mundo. Ou as criamos nós mesmas, ou possibilitamos aos machos que as criem. Nossa estrutura emocional permite ao macho que construa e que mova montanhas. Eles náo sabem disso. Sem George Sand, Chopin náo teria composto um dó ré mi sequer. Comeu, bebeu, dormiu, foi tratado, alimentado, medicado, protegido e orientado por Sand, durante dez anos, tempo em que compôs compulsivamente, e garantiu, queridos, seu lugar de honra nos salóes de Paris.

E há uma terceira conclusáo, entre pergunta e conclusáo - como podemos viver mais um dia sem o piano de Linda Bustani? Ouçam, caríssimos, e voem. Ela é a terceira personagem, a alma de Chopin no palco, e toca durante duas horas suas obras mais especiais. É a presença do artista, em forma física, e a certeza de que sua música existe e corre em seus dedos. Dedos? Asas, asas leves, sutis, velozes, sem peso, como devem ser as asas dos anjos.

Linda Bustani, premiada pianista, responsável por trazer a alma de Chopin ao palco
Foto:Divulgaçao

sábado, 8 de outubro de 2011

Dois Joãos e um Paulo

Leme,
Leste
Oeste

Cheguei, fiquei,
Vieste

A entrada da La Fiorentina, com a estátua de Ary Barroso


João querido entrou no meu caminho,
e eu segui com ele pela noite do Rio.

Paramos aqui, olhamos ali,
para onde vamos, João,
não importa onde, vamos que vamos, é sempre bom.

- Vamos na Dona Ana comer aquele pão?
Não

- Vamos entáo para a Lapa?
Náo, Nêga, hoje náo.

Fui com João para o Leme,
aterrisamos numa cantina
o cenário real da Fiorentina.

E não é que tinha
Outro João na pizzaria?

E tinha o Paulo,
o Paulo Roberto.
E eis que pensei - dois Joãos e um Paulo Roberto.
isto é que é conversa, e para mais de metro.

Neste recanto onde estávamos
fomos visitados por famosos do momento
e há famosos por todos os lados.
Cumprimentamos.
Fomos também cumprimentados.

Veio a conversa, veio a pizza, veio a salada inventada.
Veio a vida cantada e contada e lembrada

Vieram os feitos os traços seguidos
Os caminhos
Momentos passagens
Lugares
tempos
palcos
atores cantores
entrevistas
produtores
espetáculos

Vieram opiniões
nostalgias.
vitórias, açúcares, e cirurgias

Vieram as palavras, sáo homens de palavra:
um é do Rádio, dois do Teatro
um das notícias, os outros dos atos.

companheiros da letra falada escrita encantada
letra interpretada
companheiros de dramaturgos, compositores,
guerreiros brasileiros.

Pensei - é boa essa vida

entre falas e risos

e amigos em pratos em copos vizinhos
amigos em amplos abraços.
Todos protagonistas nesta cena,
Privativo roteiro, improviso de texto,
direção, divulgação, fotos, fatos.

A noite é grande nesta taberna do Leme.
Ary nos recebe na porta,
nossa, Ary, que honra, até breve

Vão as horas, passam leves
céleres como as palavras do cronista que se preze,
mais enxutas que um livro
e mais fáceis que a poesia.

Palavras e horas leves e ricas
passaram belas as horas por esta mesa,
passou a noite pela cantina.

Partimos e despedimo-nos de Ary,
que silencioso náo responde.
Sentado fica e nos observa de longe.

- E penso que sou sortuda - estive à mesa com dois joãos e um paulo.
Saboreei cada pedaço.
Sim, sou sortuda,
e boa de garfo

Nota - um beijo para Mônica, à esquerda de Paulo, e à frente de seu petit gateau, apreciadora de doces e perfumes, coisas ótimas desta vida

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Daniel Boaventura, bem aventurado

Rio
New York
Detroit
Nápoli
Terra

Daniel Boaventura, no espetáculo Songs 4 You, apresentação única no Teatro Oi Casa Grande


Português claro? Achava meio over.
Muita empostação e muita pronúncia correta de idiomas, como a querer impressionar. Bonito, uma beleza assim correta por demais, como retocada. Confessêmos, a Tv não reservou-lhe os melhores papéis. Professor de malhação e cantor-investigador de cantina italiana. Sucesso em musicais, como Evita, e A bela e a Fera, Fantasma da Ópera, mas, vamos lá, são muitos os bem aventurados no ramo. Somos o terceiro país do mundo em musicais, um indicador extraordinário para o nosso Brasil, um país com tantos problemas de educação e cultura.

Mas meu amor é meu amor e sempre tem razão. Disse: "- Vá, Nêga. Daniel canta muito." Obediente que sou, fui ver e ouvir Daniel Boaventura no Leblon.

Nada como ir. Ir para experimentar, ir para crer, ir para ver e poder dizer. Daniel Boaventura é o máximo.

Acompanhado por músicos fantásticos, com destaque para o maestro e pianista Ricardo Leão, ele oferece um show inesquecível. Abre a noite com a imbatível Fly me to the moon. Metais de primeira. Backing vocals exatos, fazendo aquela segunda voz que é um aconchego para a estrela, um acabamento, um requinte. E ele avança palco a dentro arrancando gritos e aplausos: o rapaz, é, de fato, belo. Pinta de bom moço, de galâ bem intencionado. Prossegue cantando She, e eu derreti.

O cantor é formal com seu público, distintamente carinhoso. Tem um sotaque, ainda, longe, da Bahia, misturado com um sotaque paulista, e o resultado é uma voz que canta mesmo quanto não canta. Dirige-se ao seu público com gentileza, com palavras bonitas de nossa língua bonita. Comporta-se como um gentleman, formal, cordial, terno, gravata, colete. Seu momento mais corpo a corpo, digamos, é no dueto com a vocalista Cacau Gomes, um show à parte essa moça. Cantaram a música tema de O fantasma da ópera, a romântica "- That´s all I ask of you", suaves, ternos, habéis. Olho no olho, voz na voz, nota na nota, inglês no inglês. Voz que vai, que vem, que alteia, distancia, retorna, aproxima, pede, atende. As vozes dançavam, e os dois também: ensaiaram um cheek to cheek na maior elegância.

Champagne e Amore excusa mi. Mambo italiano. New York, Hello Detroit, e vamos que vamos, cada música melhor que a outra, cada arranjo melhor que o outro, cada idioma melhor cantado que o outro. Cadeiras dançavam. Ele vai e volta para um bis imprevisível - Barry White. Sua voz grave, de barítono, balança, dança, dançamos todos, todos em pé, disco time, era dia de festa.

Temos sim um cantor de primeira grandeza, sangue brasileiro e nível internacional. Pode gravar com Tony Bennet, com Seal, com Andrea Boccelli, ou com qualquer monstro da voz, em qualquer estilo. Será um orgulho para nossa música. Se eu pudesse opinar: seu lugar é no palco, ao vivo, cantando a plenos pulmões. Cantar, caríssimos, é para quem pode, e ele pode e deve.

Se este mundo for justo, será aplaudido e reconhecido pelas melhores platéias do planeta - sua voz é grandiosa. É exímio, e interpreta com sentimento e precisão as mais lindas músicas de todos os tempos. Ouso dizer: sua voz tem o brilho de um Cauby, o swing de um Simonal e a potência de um Pavarotti.

Como não bastasse, tem a beleza de um Daniel Boaventura.

Nota: cumprimentos aos responsáveis técnicos pela qualidade de som do teatro, limpo e cristalino

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Miriam Leitão e suas notícias

Talk Show
Miriam Leitão e Carlos Sardenberg

20 anos de CBN

Miriam Leitão, especialista, jornalista, assumidade

Carlos Sardenberg, político, jornalista


Caríssimos. Pagamos uma fortuna por uma caipirinha mas não vamos a um talk show grátis. Tema do talk? O "faz-me-rir". O "dindin", nada menos que a Economia do Brasil, nos últimos 20 anos. Nada menos que Miriam Leitão e Carlos Sardenberg a discutir, agradavelmente, sobre assuntos que pesam no no bolso do brasileiro. Mas o talk show estava vazio. O brasileiro não gosta de talks, prefere sings or dances. E mais: torce o nariz para o que é público ou gratuito. Gosta de dizer que pagou caro. Gosta do que é caro, acha que é melhor, mais importante, tem mais peso. Devemos ter complexo de inferioridade, só pode ser.

Sou do contra. Fui.

Gosto de Economia, que está muito mais para a sociologia do que para finanças. Está mais para o comportamento do homem do que para seus dinheiros no banco, e se pensarmos bem, é o comportamento do indíviduo que define seu saldo bancário. E é o comportamento dos indivíduos, coletivamente, que define o status econômico da nação.

Fui ver os jornalistas. Sardenberg, que já esteve no Governo Sarney, foi mais comedido, mais reticente. Usou de piadas, de pouca informação técnica, poucos conceitos.

Mas Miriam não. Firme, fundamentada, convincente, taxativa.

A jornalista sabe tudo de política, história, economia, e mostra a cada frase fatos e fatos e atos com datas, causas, consequências, possibilidades, justificativas. Tem uma base de dados impecavelmente organizada na sua cabeça, e o conhecimento adquirido em mais de trinta anos de carreira deve estar todo classificado, etiquetado e linkado. Um assunto puxa o outro com propriedade, fluência e precisão. Orgulho para a classe feminina. Orgulho para o Jornalismo e a Economia brasileira. Unânimes os espectadores - que mulher inteligente, que mulher culta, que mulher poderosa, era o que se ouvia pela platéia, corredores, foyer, banheiros. Nada substitue a qualidade da informação. Fascina.

O lado bom é esse. O lado ruim é que as notícias são ruins, e devemos acreditar, pois quem está falando é uma assumidade do assunto.

Miriam afirma que o crescimento brasileiro dos últimos 20 anos deu-se sem avanços educacionais, sem preocupações com a questão ambiental e com concentração de Renda. Tudo errado, portanto. Prossegue que não acredita no Governo, pois há muitas pessoas de doutrinas diferentes, sem engajamento à causa da educação. Que o brasileiro estuda pouco, muito pouco, enquanto o mundo estuda muito. Que as metas do governo Dilma para educação são mínimas, e promovem pouca ou nenhuma ação neste sentido.

E que sem educação não teremos qualidade em nosso crescimento e nem aumento de renda per capita.

E assim não teremos economia estável, ponto de partida para projetos de desenvolvimento. Não haverá base para investimentos, e não há planejamento de longo prazo.

Pior: nossa democracia está ameaçada pela corrupção. A corrupção traz a descrença do jovem no sistema democrático, e isto é uma ameaça real `a liberdade política que temos hoje. Pergunta-se até quanto vai-se suportar a corrupção em nome da democracia.

Silêncio. Aplausos.

E ela fecha, respondendo a uma pergunta da platéia. "- O que diria a um jovem de 20 anos?"

"- Sonhe alto, trabalhe duro, e estude muito". Sardenberg emenda: "- e poupe. Gaste menos do que ganhe, e aplique seu dinheiro".

Senhores políticos, sigam estes conselhos, simples como manda a boa estratégia,e as notícias para os próximos 20 anos serão melhores.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

O Rei Leão

O Rei
O Leão
Culpado
Castigado
Libertado



É preciso viver, e viver não é brincadeira não.

O Rei Leão que o diga. Sua história é bem dura para um conto infantil.

A trama reúne traição, morte, culpa, condenação, e por fim, a vitória.

É o seguinte: O Rei, Musafa, morre em uma emboscada, vítima de seu próprio irmão, Ascar. Esse malvado incute no herdeiro legítimo - Simba - culpa pela morte do pai. Convence o sobrinho de que foi ele, o único filho, o responsável pela tragédia e que somente o exílio evitaria um desgosto ainda maior à Rainha Leoa. Anos passados, o Leãozinho no exílio, o Rei Cruel no poder.
Mas há fofocas também no reino das savanas africanas, e o Leãozinho descobre a verdade. Volta, grande, belo, forte, liberto de sua culpa, para lutar e assumir seu trono. Vence. O bem triunfa, em linda canção e coreografia, e todos nós nos sentimos vitoriosos e vingados.

Uma historinha difícil de contar para crianças pequenas. A idèia da morte, ganância e traição bem definidas no enredo. Os espectadores de menor idade precisam de muita explicação, e as mummys ficam como tradutoras. As palavras usadas nos diálogos reforçam a idéia de que crianças com mais de 7 anos entenderão melhor - os bichos bons utilizam todo um linguajar real com suas reverências e formalidades, e os bichos malvados, os deboches e ironias.
Para levantar o astral, o exílio é alegre. Os párias da sociedade, o porco e o cachorro, são hilários, os atores convencem, e a vida é animada à margem da sociedade.
Curioso isso - o exílio é mais alegre que a vida na corte, há união, amizade, cantorias, risos. Praticam o HAKUNA MATATA, que quer dizer SEM PROBLEMA, o velho lema NO STRESS ou BE HAPPY. Adorei. Estou praticando desde então. Vem um problema, eu ignoro. Percebi que os expulsos do reino (e eu) vivem assim muito melhor. Seguirei.

O leãozinho volta então um leãozão. Livre da culpa, fortalecido, enfrenta o tio mau, domina a situação e reina. O Reino de Simba.

As crianças entenderão mais tarde. O mundo adulto é um jogo de culpa - castigo - perdão. Começo, recomeço, conquista, reconquista. Acusações. Julgamentos, condenações. Liberdades. E não há macaquinhos para cochichar que você é inocente. Que você, criatura selvagem, é livre, não errou, não pecou, e pode ser feliz. É preciso encontrar, por nossos próprios e falíveis meios, a aprovação e a defesa de nossos atos. E a reviravolta, a conquista do reino, depende exatamente disso. Empurrar para longe os inimigos íntimos. Resistir às tramóias invisíveis. Matar seu predador, a cada dia.

Não devo, mas vou dizer. Faltou. Faltou mais capricho. Para um público exigente, os figurinos parecem incompletos, faltam acessórios para as patas, fundamentais para a caracterização de animais; a caracterização não corresponde ao imaginário infantil, e o leão jovem foi confundido, por vários infantos, com um macaco. Sua movimentação não é a de um felino.

A atriz que faz o macaco é a melhor. Disparado. Potência de voz, macaquices, movimenta-se rápida e desengonçada como os macaquinhos mais levados. É acrobata e se pendura em um cipó como ninguém. Mas ela conspira contra a gramática:-" Que os deuses o proteja, que os bons ventos o traga " - bem alto, peito estufado. E apunhala de novo o português, no momento agradecimento - "Tem três pessoas que foram inevitáveis para a realização desta peça."
Senhora, senhorita, d. Macaca: as pessoas são imprescindíveis ou fundamentais. As situações é que são inevitáveis. Desculpe, não deu, pronto falei.

Falemos da parte que agradou muito mães, avós, babás. É a estréia do galã Cassio Reis como empresário / produtor de teatro infantil e ele estava presente, lindo e louro, com o filho Noah. Um mimo para os olhos, um rapaz jovem, empreendedor, acompanhado do filho. Sem dúvida, sua subida ao palco ofuscou os atores. O bonito agradeceu educadíssimo a presença de todos, e explicou: "Escolhi esta peça porque ela mostra o valor da fé, do que a gente traz de bom no coração. Prova que o amor vence no final".

Tomara, Cassio, tomara.