domingo, 16 de outubro de 2011

Chopin e Sand

Rio,
Leblon
O que seria do Rio sem o Leblon?
E o que teria sido de Chopin,
sem Sand?


Lindo Chopin, Linda Sand

Eu amo Chopin.
Composiçoes tristonhas, lentas, fortes, frenéticas.
Acompanhou-me infância adentro e adolescência afora nas aulas de ballet - todos, absolutamente todos os exercícios de barra eram executados sob o ritmo de Chopin.
Adágios, adágios, e mais adágios. Hoje reconheço que tive a honra de ter Chopin em meus ouvidos e pés, durante muitos anos.

Sabido que fôra um gênio, sobrenatural seu dom. Incorporava o som de suas composiçoes; era o corpo de suas partituras. Isso sabe-se, sua obra é legado universal, e espera-se e perdoa-se em um gênio, sua extravagância. Sua excentricidade, suas loucuras e desvarios fazem parte de sua personalidade, e caracterizam-no ainda mais. Chopin náo havia de ser diferente.

O espetáculo mostra o romance entre Chopin e George Sand, pseudônimo da condessa Aurora Dupin. Outro gênio, escritora genial em sua irreverência e ousadia.
Teríamos portanto, a bomba e o estopim. Dois gênios juntos sob o mesmo teto. Explosáo.

Nada disso, gente. Romance sem palavras é um espetáculo suave, profundo, cálido.
Doloroso sob vários aspectos. Vi no palco do Teatro um casal com problemas de gente comum, problemas bem atuais inclusive - o homem que é egoísta, infantil, voluntarioso, imperativo, estúpido. E a mulher que é doce, carinhosa, condescendente, cuidadosa, amorosa, rejeitada e explorada.
Lindos, Françoise Fourton e Marcelo Nogueira
Foto:Divulgação

Sand podia ser corajosa da porta para fora. Da porta para dentro, todos os seus atos eram para atender, prover, cuidar e sustentar a saúde e a criaçao da obra de Chopin. Mecenas, talvez, apaixonada, certamente, ela escreve dia e noite, como uma operária da literatura, para manter seu reino. Chopin teve ao seu lado, a vida tranquila que sua saúde péssima e seu coraçao duro exigiam.

Sand fez de tudo por este homem. Poucas vezes recebeu dele carinho ou amor. Companheiros de boêmia, sim, mas de cama, náo. Chopin a rejeitou por anos, vivendo sob o mesmo teto.

E ela, como tantas, seguiu. Até que um dia, um belo dia, saturada, encerra o assunto, liberta-se, e seguem, cada um o seu caminho.

O texto da despedida é de rachar o coraçao. O amor é triste, tristíssimo quando acaba. E náo adianta voltar sobre o que restou, Sand afirma sabiamente. Náo adianta mesmo. E escrever outro fim para o romance também náo foi possível para a escritora. As histórias reais náo sáo escritas pelos humanos, talvez por deuses temperamentais.

Temos entáo uma história linda, um Marcelo Noqueira ótimo, como Chopin, e uma Françoise Fourton divina. Futuquei na Wikipedia. Françoise tem mais idade do que parece, náo cometerei a deselegância de repetir dados que nem sei se sáo confiáveis, mas se sáo verdadeiros, esta mulher é um fenômeno. Corpo, rosto, mãos, voz, movimentos, trejeitos, brilho no olhar, nada lembra a idade afirmada pelo site - passa por uma mulher de trinta anos com a maior tranquilidade. E dá um show no palco. Grande atriz, envolve o espectador com sua escritora/condessa/apaixonada/ dedicada/ cúmplice/incansável George Sand, e esquecemos do mundo diante do mundo que criou para seu Chopin. Compreendemos perfeitamente o tamanho do seu amor.

Deste espetáculo tirei duas conclusóes: 1. Chopin era insuportável. Fosse marido meu, iria compor ao relento e morreria tísico. Um chato de primeira. Eternamente reclamando, insatisfeito, inseguro, irritado, perdulário, egocêntrico e desprovido de apetite sexual.
2. Nós, mulheres, somos responsáveis pela maioria das maravilhas do mundo. Ou as criamos nós mesmas, ou possibilitamos aos machos que as criem. Nossa estrutura emocional permite ao macho que construa e que mova montanhas. Eles náo sabem disso. Sem George Sand, Chopin náo teria composto um dó ré mi sequer. Comeu, bebeu, dormiu, foi tratado, alimentado, medicado, protegido e orientado por Sand, durante dez anos, tempo em que compôs compulsivamente, e garantiu, queridos, seu lugar de honra nos salóes de Paris.

E há uma terceira conclusáo, entre pergunta e conclusáo - como podemos viver mais um dia sem o piano de Linda Bustani? Ouçam, caríssimos, e voem. Ela é a terceira personagem, a alma de Chopin no palco, e toca durante duas horas suas obras mais especiais. É a presença do artista, em forma física, e a certeza de que sua música existe e corre em seus dedos. Dedos? Asas, asas leves, sutis, velozes, sem peso, como devem ser as asas dos anjos.

Linda Bustani, premiada pianista, responsável por trazer a alma de Chopin ao palco
Foto:Divulgaçao

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