segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Somos todos iguais

Rio
River
Galeria River que leva ao Mar

Foi bem aqui



É preciso emagrecer. É preciso caminhar, com força, vigor, e barriga para dentro.

Fui.

Andei, inabalável, pelo sol inclemente desta rota litorânea - Francisco Otaviano, Vieira Soooutooooo, Delfim Moreiraaaaaa, e voltei pelo mesmo chão.

Vi gente, gentes, porque nenhuma pessoa é igual a outra: gente sozinha, em par, em trios; gente feia, bonita, magra, gorda, careta, rica, pobre; hippies, adultos, children. Surfistas, corredores, cadeirantes. Ambulantes, comerciantes. Patinadores. Vi até as dezenas de bicicletinhas do Itaú. De tudo um pouco, todos por aí.

Volto, satisfeita com a convivência pacífica das diferenças sob o Sol, e eis que em frente a Galeria River há uma quizumba. Mesmo.

Gritos, gente parada, afastada, olhando. A protagonista é uma mulher negra, de short jeans e top, descalça, com um bebê, negro, no colo. Ela se mexe enquanto fala, trêmula, histérica. Dispara para o segurança, negro, engravatado neste calorão, sério, impassível: "- Você é igual a mim. Você não é p.... nenhuma. Você só tem esse trabalho aí. Sem esse trabalho você é igualzinho a mim: preto, pobre, fu....". Seu bebê olha sobre seus ombros, morde as mãos. Tem uma menina pequena ao redor dela, negra também, de bikini amarelinho, pé no chão, cabelo com lacinhos, uma menina tão bonita, tão brasileirinha, está apavorada, nervosa, seus olhos indagam, aguardam reações. Ela anda a seu redor, meio que protegendo-a com seu ínfimo corpo.

Mais gritos. " - Você está aí, parado, e não vê quem você é. Você não é ninguém, é como eu, fu..... como eu. "

Em meio a umas cinquenta pessoas paradas, estáticas, ela abre caminho e segue. O bebê sacodindo em seu colo e a menina rodopiando, atônita, ignorada, muda.

O segurança mudo. A rua, muda. Eu, muda.

É isso, senhora. Diferenças à parte, somos todos iguais. Somos todos gente, há quem esteja na autoridade e quem esteja subjugado; quem grite e quem cale, quem mande e quem fuja. Quem faça escândalo, e quem ouça intimidado.

Negros, brancos, estudados, bem sucedidos, desempregados. Todos iguais. Tire a circunstância em se encontra, o bicho Homem é só um bicho Homem, e se defenderá, como puder ou souber.

Não sei o que causou sua reação. Não perguntei ao público. O povo ficou ainda por ali depois que ela se foi, e ninguém parecia muito a fim de conversa. Fomos todos nos dissipando aos poucos, enquanto sua voz, insistentemente, ficava por ali, e ensurdecia os barulhos locais.

O segurança, invulnerável. Preso em seu terno, não reagiu. Não sei se concorda ou se discorda, se entende que sua autoridade limitada provém de seu posto, unicamente de seu posto de segurança. Não tem legitimidade pública de nenhuma espécie e sua comarca termina ali na calçada.

Essa é nossa condição de brasileiros - tirem-nos nosso emprego, o terno, e a pose, confisquem nossas carteiras de classe, nossos óculos Rayban, nossos cartões de crédito. Igualem-nos, porque já somos iguais por natureza. Ora melhores alimentados e vestidos, ora nus, ora doentes, ora amados, ora rejeitados. Ora com filhos pequenos a cuidar, ora sem filhos, ora com dívidas, ora abonados.

A dor, a que corta o peito e faz sangrar, essa é nossa intercessão. É única e nos equipara, humanos, terráqueos, paridos do barro. Somos e seremos todos iguais em nosso desespero. Chegada nossa hora, partiremos desta terra deixando lixo e histórias, talvez meritórias, talvez vergonhosas. Talvez herança, talvez o bom exemplo, talvez nada. Aí sim, diferiremos. Pelo legado, pela obra; pelas transformações que tivermos provocado e contribuído; pelo bem ou mal que tivermos causado.

Seguirei na caminhada e no pensamento. Afora nossa casca, caríssimos, o coração é sempre o mesmo.

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