domingo, 16 de janeiro de 2011

Simonal - ninguém sabe o duro que eu dei

"Simonal - ninguém sabe o duro que eu dei"




Alguém leu "Fogueira das Vaidades", de Tom Wolf? Um jovem político, em carreira promissora para o partido, atropela, em rua escura,deserta,e tomada pela neblina, uma criança negra. As consequências deste ato acabam com sua vida política. Mas quem, quem enxergaria uma criança pequena e negra na neblina de uma rua deserta? Todos poderíamos ter cometido o mesmo trágico erro.
Simonal errou. Estava no auge. Sucesso, sucesso e mais sucesso. Era o rei da cocada preta. Fazia 340 shows por ano, amigo de Pelé, tinha três Mercedes e uma cobertura em Ipanema. Dominava a massa. Tudo tem custo, o custo era alto, para onde foi o dinheiro? Mandou dar um susto no contador. Errou na mão. O contador abriu o bico. Carregou nas tintas. Fez-se de muito vítima, mas para onde foi o dinheiro? Simonal perdeu o rebolado. O Rei do Swingue foi crucificado vivo, seu pecado multiplicado. Pagamos o preço por ter calado o maior cantor do Brasil. Como diz Miele, quem puder aponte outro. Ninguém apontou.
Mas era a Era do Medo. Todos tinham medo. O medo imobiliza e torna a ameaça maior do que é. Domina-se um amedontrado facilmente, mas não há exército que domine um corajoso. Não havia corajosos no Brasil dos anos 70, estavam sendo torturados nos porões, por outros, que não o Simonal.
Os cruéis adoraram. Os sádicos apoiaram. Os invejosos endossaram. Os racistas, bem, os racistas gozaram. Simonal era um debochado, e debochava da pretensa seriedade da época, o que não agradava a todos. Gostava da malandragem e de parecer malandro. Era um negro que não queria ser branco. Escalou a montanha do Sucesso muito jovem, e ficou lá em cima rindo, dançando, e regendo o povo. Outros queriam reger, não eram obedecidos. Orquestraram portanto, o silêncio.
Cale os bons, imobilize os bons, e o mundo acaba. O ídolo volta a ser a criança humilhada que comia escondida. Conveniências atendidas, o negro volta ao seu lugar de cativo.
Sinto-me em dívida com Simonal. Uma vez perguntei aos meus pais quem era. Mandaram que eu me calasse, e eu, como todos os outros, calei-me.
Mas vivemos a Era da Liberdade. Posso colocar Meu Limão Meu Limoeiro BEM ALTO, para invadir a casa dos vizinhos. Posso cantar MAIS ALTO AINDA QUE mamãe passou açúcar em mim; canto, e digo que adoro o som da pilantragem, e posso ainda ousar dizer que a pilantragem deixou filhotes, e influenciou o samba rock sim. Quem esteve na festa Soul da Fundiçao Progresso dançou, e nem sabe, dançou a pilantragem.
Posso ousar dizer que Simonal foi o melhor cantor sim.
Não repetirei o erro da geração que nos privou dessa alegria, alegria.
Vou dizer para todo mundo que adoro o filme, adoro o cantor, e adoro a possibilidade de aplaudir, ainda que tardiamente,o talentosíssimo Simonal.

4 comentários:

  1. Concordo com tudo que vc escreveu, SIMONAL pagou um preço altissimo por ser "o Rei da Cocada preta"...
    Lembro-me muito bem do último show que fez no RJ, na boite do antigo Hotel Meridien, quando entrou com seu saxofone cambaleando, pouco folego e poucos amigos na platéia, uma grande perda pra quem foi O MAIOR E MELHOR de todos.

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  2. Meu amigo, concordo com vc, mas não só pq era a época da ditadura, ainda hoje se a pessoa for "pobre e preto" e conseguir galgar alguns degraus da fama sempre vai aparecer algum invejoso para tentar derruba-lo.
    É uma pena que o Simonal tenha partido sem ter o seu grande talento reconhecido. Realmente ele era O MELHOR

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  3. Infelizmente por conta de patrulheiros ideologicos covardes e preconceituosos a carreira de Wilson Simonal foi destruida.
    Seu trabalho ficou, mas nada trará de volta e nada recompensará esse talento jogado fora .
    Eu tenho a lembrança de cantarolar alegremente as canções de Simonal qdo criança e fico triste ao pensar q este artista morreu tão injustiçado.

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