Rio de Janeiro,
Colégio São Paulo,
Muitos,
muitos anos atrás
Vejam que pônei forte, vigoroso, bem tratado. Lindo
Tive uma professora chamada tia Carminha. Senhora de hábitos rigorosos, de educaçao clássica, cultíssima. Da Família Pacheco Leão, nome de rua no bairro do Jardim Botânico. Sob sua face simples e seus trajes austeros, trazia consigo um coração de ouro e um baú de histórias a contar. Nós, pequenos e uniformizados, sentadinhos, aguardávamos ávidos por sua chegada. Era recebida em nossa turma com festas.
Começava suas aulas de português com um conto, sempre. Diria-os fábulas. E tia Carminha ofereceu-nos a do cavalinho inglês.
Não entendi. Preferia o do menino chinês, que se perdera dos pais, e fora identificado anos depois por ter um dedo a menos; ou ainda da cachorrinha que salvara o bebê. Eu preferia os finais felizes.
O conto do cavalinho inglês pareceu-me triste e sem graça.
Hoje o entendo mais triste ainda, e náo tem graça mesmo.
Mas entendo, também tristemente, sua mensagem.
O negócio é o seguinte: um senhor excêntrico, inglês, tinha em sua bela propriedade um cavalinho de raça. Queria-o muito bem, paparicava-o com papas de aveia e alfafa.
Tratadores especializados.
Veio a crise na Inglaterra. O senhor náo quis se desfazer do caro bichinho, e resolveu que iria acostumá-lo com menos mimos. Dispensou os empregados, todos, e inclusive os tratadores. Chega de papas de aveia. O cavalo emagreceu, e aguentou. A crise aperta. Cortaria a alfafa. Aos poucos. Um pouco menos a cada dia.
"- Aumentarei a água, e diminuirei aos poucos a tal da alfafa", pensou o nobre senhor.
O cavalinho foi se acostumando. A cada dia, menos alimento. O fazendeiro dividido entre todos os afazeres, dedicava-lhe pouco tempo. O cavalinho perdendo peso, mas sobrevivendo. Relinchando menos, trotando menos. Sossegado, mas vivo. O fazendeiro satisfeito: está dando certo! Esse bicho há de sobreviver sem me dar custos! Vai ficar só na água e está ótimo.
Quando o cavalinho estava quase se acostumando, mas quase mesmo, bem, aí o animal morreu.
A turma fez: Ah.... que pena. E a liçao seguiu.
Esta história ficou em meu coraçao para sempre, como a querida tia Carminha e sua rara sensibilidade: ela sabia que era para lembrarmos depois. No momento certo, a história voltaria a nossa memória, cheia de significados.
O cavalo é o Amor. O nobre inglês, é a criatura que amamos, e que precisa cuidar do nosso Amor.
Poderemos até sobreviver com pouco, ou com menos do que precisamos, mas nunca, nunca seremos saudáveis, viçosos e felizes se racionados forem os carinhos e os cuidados.
O Amor em exuberância precisa de força, de vigor, de plenitude, de fartura.
Se você tem aí seu cavalinho, seja o marido, amigo, filho, defenda-o da miséria emocional. Dê-lhe muito, do bom e do melhor. De mão aberta, sem economias.
Que ele valha mais que todas as moedas do mundo. Mais que as posses, que as escrituras, que os contratos. Mais que o status social. Mais que o tempo contado, mais que os planejamentos.
Mais que nossos medos e maluquices. Mais que a insegurança e as perdas sentidas.
Que seja simples amá-lo, espontâneo. Que seja inevitável.
Amor com amor se paga. A única paga possível, caríssimos, é mais Amor.
(já dizia tia Carminha...)
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