sexta-feira, 15 de abril de 2011

O vôo da amiga

Rua da Assembléia,
Centro, Meio,
Marco, Nervo.
Ponto de partida para o começo.

Decolar sem medo


É preciso coragem.
Minha amiga tem, e como.

Deslumbrante, como são as minhas amigas. Esta tem um plus - sua personalidade é um furacão. Remexe profundamente e com rapidez a poeira estagnada.
É incisiva em suas observações e atos. Nada de superficialidades ou demoras.
Vamos agora e vamos para valer.

O cara nem sabia com quem mexeu. E mesmo ela, não sabia do que era capaz.
Alguns homems não reconhecem a peróla; enxergaráo, mais facilmente, os farelos.
O bicho homem em questão nunca teve uma mulher com tal cultura, tal beleza, tal coração. Tal poder de decisão.

Assustou-se. Preferia o conforto de não ter que melhorar.

E enrolou-se. Mentiu. Arrumou o argumento, pediu um tempo. Tempo? Detesto isto. Náo há tempo a perder,
ou passa-se tempo junto, ou separa-se o tempo, fica cada um com o seu.

Bem, havia planos que estavam na prateleira, aguardando o tal tempo.
Um deles, lindo e colorido, era uma viagem para a Florida, para esquiarem n'água e compras náuticas. O cara era chegado no alto mar.

O plano, quando é plano, te incomoda. Te cutuca e te empurra para fora da cama.
Faz contas para você. Faz até suas malas. Era assim para ele, que resolveu ir com outra. Era assim para ela, que foi informada desta traição. Soube que o roteiro seria interpretado por outros atores. Ela fora excluída da cena.

Mas gente, mulher furacão não é assim não. Ninguém a exclui. Quem determina espaço, fala, cena, iluminaçao e fundo musical é ela, quem mais? Ela consegue reservar lugar no mesmo vôo e me avisa que vai embarcar. Peço que náo vá. Tento demover, temo um problema aéreo de consequências internacionais.

Calo-me e entrego a Deus.

O que segue é o esperado. Minha furacão depara-se com aquele que até dois dias antes fora seu marido. Depara-se com outra atriz em seu papel, sem o necessário phisique du rôle, se me faço entender. Sem calma. A classe está em enfrentar a dificuldade com calma. A sucessora fala alto, gesticula, nervosa, náo entende nada. Afirma em altos brados no check list que formam um casal.

Essa gente me intriga. Formam um casal rapidamente. Assumem sua expectativa amorosa rápida e facilmente. Declaram seu estado emocional, mais valioso que o civil, publicamente.

Para minha amiga, bastou manter sua habitual pose. Embarcou, altiva e vitoriosa, em poltrona próxima, da onde via e era vista pelo casal. O avião levanta vôo, e há três protagonistas neste drama, cada um de seu monólogo: o sujeito, constrangido, raivoso, reativo, inconformado de ver seus planos ruindo. A minha furacão, doída, altiva, superior a essas falcatruas. E a coitada da substituta, longe de poder interpretar o papel e perdida no texto mal decorado.

Chegam ao destino depois de oito horas de convivência forçada. O sujeito esteve por oito horas sem máscara. Deve ter até estranhado.

Alguns passageiros mais sensíveis perceberam e observaram. Houve quem fizesse, silencioso, uma prece, para que os corações se acalmassem.

O vôo kamikase foi um sucesso. Aterrisou em terra abençoada.
Ninguém morreu, além do sonho. O tiro de misericórdia matou a ilusáo.

Tudo deu certo. Saem porta afora, alfândega afora, Florida afora.

Vida nova afora.

Minha amiga aperta o casaco, chiquérrima. Os cabelos negros brilham mais que nunca. Empunha seu Ray Ban original. Olha a hora em seu Swatch original. Náo é mulher de imitações, de limitações e de falsidades. Quer o original, direto da fábrica, de primeira linha. Sem truques, e sem recall.

Venceu. Seu ato corajoso salvou sua dignidade, o artigo mais caro de sua personalidade.

Um comentário:

  1. Queria ter um décimo da coragem da sua amiga. Graças a Deus jamais tive que passar por isso, mas com certeza não faria a mesma coisa. Parabéns para ela. Deixar barato por quê?

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